Não seria preciso muita empatia para saber que o fim da gratuidade para idosos de 60 a 65 anos vem no pior momento possível, com a perda de renda de milhares de famílias em decorrência dos impactos econômicos e sociais causados pela pandemia de covid-19
Desde o dia 1º deste ano, o governo do estado e prefeitura de São Paulo cortaram a gratuidade no sistema de transporte público que valia a partir dos 60 anos; a partir de agora, isso vale somente passageiros acima dos 65 anos que utilizam ônibus municipais e intermunicipais EMTU, Metrô e CPTM. Ou seja, a pessoa que tem entre 60 e 65 anos também passa a pagar a passagem, que custa R$4,40. Assim, considerando um trajeto de ida e volta que use apenas um meio de transporte, sem integração com outros meios (R$8,80), o idoso terá que pagar um valor equivalente a compra de 1kg de feijão no supermercado, o que poderia render 5 refeições de uma família de 4 pessoas, pelo menos.
O retrocesso, segundo o governo estadual e a prefeitura paulistana, acompanha a revisão gradual de políticas para o idoso, a exemplo da ampliação da aposentadoria compulsória no serviço público, que passou de 70 para 75 anos e a recente Reforma da Previdência, de âmbito federal, que aumentou o tempo de contribuição e subiu a idade mínima de 65 anos para aposentadoria para homens e 62 anos para mulheres.
Bem ao estilo tucano de governar, a medida foi aprovada pela Câmara Municipal de São Paulo em 22 de dezembro e o prefeito Bruno Covas (PSDB) rapidamente sancionou a lei, já no dia seguinte. Covas também revogou a lei municipal 15.912, de 2013, que garantia o benefício. Fazendo sua parte da dobradinha, o governador João Doria (também PSDB) editou decreto suspendendo a regulamentação da legislação que permitia a gratuidade para essa faixa de idade, alterando a Lei nº 15.187, de 2013. O projeto foi aprovado pela Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp).
Não seria preciso muita empatia para saber que o fim da gratuidade para idosos de 60 a 65 anos vem no pior momento possível, com a perda de renda de milhares de famílias em decorrência dos impactos econômicos e sociais causados pela pandemia de covid-19. Olga Quiroga tem 84 anos, faz parte da União dos Movimentos de Moradia de São Paulo (UMM-SP) e é coordenadora do Garmic (Grupo de Articulação para Moradia do Idoso na Capital Paulista). Ela explica que a dificuldade financeira para pessoas idosas tem sido enorme. “Para se ter uma ideia, o aluguel em um cortiço custa entre 700, 800 reais… na favela, o aluguel mais barato em um cômodo sai por volta de 450 reais. E com o fim da gratuidade teremos que somar a isso os gastos de deslocamento, porque os idosos precisam trabalhar e trabalhar muito, e o transporte público faz parte dessa rotina diária”, contextualiza Olga.
Ela explica que a cobrança de tarifa para essa faixa etária terá ainda outros impactos gravíssimos na renda mensal das famílias. “Não podem comparar o que uma pessoa mais jovem gasta mensalmente com a vida de uma pessoa idosa. Nós, idosos, temos gastos bem mais altos além dos gastos básicos. Na saúde, por exemplo, os remédios estão subindo cada vez mais de preço e precisamos disso muito mais. Além disso, se buscamos o serviço de atendimento à saúde em uma região e não tem um médico da especialidade necessária, o idoso precisa pegar transporte público para se deslocar para outra região. E então, quanto de passagem vai gastar para ir e voltar?”, reforça.
Vale lembrar que no mesmo mês que Bruno Covas sancionou lei para a cobrança de passagem para pessoas entre 60 e 65 anos de idade, também sancionou lei que aumenta o próprio salário em 46,68% e eleva também o salário do vice-prefeito e de secretários municipais. A partir de 1º de janeiro de 2022, o salário do prefeito passará de R$ 24.175,55 para R$ 35.462,00. Seu vice, Ricardo Nunes, passará a receber de R$ 21,7 mil para R$ 31.915,80, e seus secretários municipais, de R$ 19.340,40 para R$ 30.142,70.
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