O Plano Diretor Estratégico de São Paulo de 2002 tem uma visão avançada no que se refere a construção de uma cidade includente, com o respeito ao direito à moradia a todos e todas. Em seus diversos artigos, defende a moradia, especialmente para os mais pores, nas áreas infraestruturadas da cidade, a regularização fundiária e a urbanização das favelas e o cumprimento da função social da propriedade. O plano propõe a reversão do modelo de periferização e de ocupação de áreas ambientalmente frágeis, rompendo a exclusão sócio-territorial a que estamos submetidos.
No entanto, não foi o que vimos na sua implementação. Enquanto os instrumentos destinados ao mercado imobiliário foram todos regulamentados e implementados, os artigos destinados à moradia dos mais pobres parecem ter, literalmente, sumido do mapa.
A União dos Movimentos de Moradia apresenta, neste documento, alguns pontos para a avaliação do PDE, no que se refere aos instrumentos urbanísticos e à política de habitação.
TERRA PARA MORADIA POPULAR
O conceito de ZEIS de áreas para a produção habitacional (ZEIS 2, 3 e 4), permitindo HIS e HMP acabou sendo apropriado pelas faixas de renda de maior poder aquisitivo e pelo mercado imobiliário. O limite de renda para HIS (até 6 salários mínimos) e de HMP ( até 16 salários mínimos) nas ZEIS não prioriza os mais pobres. Pelo contrário, privilegia a produção para a chamada faixa 2 de renda, dirigindo as melhores ZEIS para o mercado.
Além disso, a quantidade de metros quadrados em ZEIS para a produção habitacional foi muito pequena em face do enorme déficit habitacional da cidade e não foram utilizados outros instrumentos previstos no PDE, como parcelamento, edificação ou utilização compulsórios, para estimular sua utilização.
A UMM tem utilizado terrenos em ZEIS para seus empreendimentos no Programa MCMV Entidades, embora sem ter contado com nenhum apoio institucional para viabiliza-los e defende que as ZEIS devam ser redimensionadas e serem dirigidas prioritariamente para as faixas de renda mais baixas.
O padrão de habitação de HIS (com padrão de unidade habitacional com um sanitário, até uma vaga de garagem e área útil de no máximo 50 m²) não garantiu a destinação desses imóveis por famílias de baixa renda e ao mesmo tempo limitou o desenvolvimento de projetos de melhor qualidade.
2 – MORADIA EM ÁREA CENTRAL
Enquanto o PDE fala na construção de moradia nas áreas estruturadas da cidade, poucas ZEIS 3 foram ocupadas para essa finalidade. Moradia popular continuou sendo sinônimo de moradia precária e longe. Isso sem falar, em varias ZEIS que não atenderam á legislação, como já atestou o próprio Executivo Municipal.
3 – REGULARIZAÇÃO DAS FAVELAS, CONJUNTOS HABITACIONAIS E DEMAIS ASSENTAMENTOS PRECÁRIOS.
Poucas das ZEIS 1 foram regularizadas. Poucas dessas áreas cumpriram o previsto no PDE, com a constituição de Conselhos Gestores representativos e a definição de projetos de regularização e urbanização participativos. Há conselhos gestores que foram fundamentais para garantir os direitos dos cidadãos, mas ao mesmo tempo, muitos são vistos como meros simulacros de democracia.
4 – DEFESA DO DIREITO À MORADIA
Uma das consequências da falta de implementação do PDE foi o crescimento dos despejos em nossa cidade. Até em áreas onde as famílias detinham a CDRU ocorreram reintegrações de posse, pressionada pela voracidade do mercado e por uma política higienista. Argumentos em defesa do meio ambiente, da segurança e do interesse público foram utilizados para varrer comunidades inteiras, sem garantir o direito à moradia e nem mesmo o reassentamento, fazendo do “cheque-despejo” a política para as favelas.
5 – MECANISMOS DE PARTICIPAÇÃO E CONTROLE SOCIAL
Especialmente nos últimos 8 anos, a participação e o controle social foram deixados de lado na política municipal de habitação. Não foi realizada nenhuma Conferência Municipal de Habitação e as definições das políticas e programas foram decididos unilateralmente pelo Executivo Municipal. O Orçamento Participativo na Habitação não foi implantado e o Conselho Municipal de Habitação foi relegado a órgão gestor do Fundo Municipal, que, por sua vez, contou com uma parte mínima dos recursos da habitação da cidade.
Além disso, estamos há mais de 1 e meio ano sem Conselho, enquanto as definições da política da atual gestão estão sendo tomadas sem ser submetida a essa instância prevista, inclusive, no PDE.
6 – PLANO MUNICIPAL DE HABITAÇÃO
O Plano Municipal de Habitação, além de ter tido atraso de 6 anos, desconsiderou diversos princípios e diretrizes do PDE e não contou com ampla participação. Sem um censo habitacional, a UMM entende que o déficit quantitativo definido, de 227.000 moradias, está muito aquém da realidade da cidade. Os dados sobre os cortiços são irrisórios.
Além disso, o PMH não apresenta uma estratégia de política fundiária pública para a viabilização de terras para habitação popular, o que, na prática, inviabiliza o acesso à terra urbanizada e bem localizada para morada popular. A Prefeitura deve ser protagonista na viabilização de terra para moradia, utilizando, inclusive, os instrumentos previstos no PDE.
7 – FALTA DE ARTICULAÇÃO DAS POLÍTICAS
Novamente, o PDE avança propondo na articulação das políticas de habitação, desenvolvimento urbano, mobilidade, ambiental, entre outras. Na prática, cada pasta seguiu com suas prioridades e essa articulação não aconteceu, dispersando no território as iniciativas, inclusive com a contraposição de algumas delas, como na construção dos parques lineares, onde moradores de favelas foram despejados sem nenhuma articulação com políticas de habitação. O tratamento diferenciado aos projetos autogestionários não foi implementado.
8 – PROCEDIMENTOS ESPECIAIS E AGILIDADE NA APROVAÇÃO DE HIS
Embora o PDE estabeleça procedimentos para a análise e aprovação de projetos de habitação social, as entidades tiveram que se submeter a períodos de mais de 2 anos para aprovar projetos, demonstrando a total falta de prioridade para a moradia popular.
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