Assim, a Missão em São Paulo teve por objetivo investigar a ocorrência, ou riscos, de despejos forçados de moradores configurando situações de violação do direito humano à cidade, em especial do direito humano à moradia, e identificar estratégias e instrumentos de exigibilidade do direito à moradia.
7.1. Recomendações Emergenciais
a) A suspensão dos casos de despejos e das obras de intervenção que coloquem em risco a vida das famílias até que seja discutidos coletivamente os projetos de urbanização e reassentamento das famílias envolvidas;
b) Ações imediatas de reparação às famílias prejudicadas pelas obras (danos nos equipamentos e bens, acidentes pessoais, etc.) ou demolições das suas moradias;
c) Revogação do Decreto Municipal nº 48.832 de 17 de outubro de 2007 e da Ordem Interna nº 03 de 08 de julho de 2008.
d) Garantia de atendimento emergencial e preferencial às crianças e adolescentes para que não venham a perder o ano letivo em função de remoções e/ou despejos imediatos;
e) No caso de uma família ser inserida em programa de aluguel social temporário, o poder público deverá garantir por escrito que essa família tenha um imóvel em determinado prazo e que esta família fará parte da tomada de decisões sobre a sua nova moradia.
7.2. Recomendações Específicas
i. Favela do Sapo – São Paulo
a) A imediata suspensão das ameaças de despejo das 455 famílias que residem na favela do Sapo, promovidas pelo Poder Público Municipal.
b) a discussão conjunta com os moradores de um projeto de habitação de interesse social para a totalidade dos moradores ali situados, vivendo em áreas de risco.
ii. Favela da Vila Guilherme – São Paulo
a) A anulação do processo de reintegração de posse contra as famílias para que desocupem o local, tendo em vista o fato das mesmas não terem sequer sido citadas no processo para realizar a sua defesa, direito ao contraditório e a ampla defesa.
b) imediata desapropriação da propriedade da empresa Cerâmica Vero (originalmente Cerâmica Sallus) pelo Poder Público Municipal, garantindo a permanência das 400 famílias que residem no local.
iii. Parque Linear do Tietê – São Paulo
a) Suspensão imediata das ameaças de despejo envolvendo 3.900 famílias que vivem na área onde será construído o parque Linear do Tietê.
b) discussão com as comunidades do projeto de urbanização e construção do Parque Linear do Tietê.
c) assistência social as famílias em situação de vulnerabilidade social, principalmente aquelas com crianças e adolescentes.
d) a adoção, pelo Poder Público Municipal, das seguintes medidas emergenciais: (i) esclarecer e informar, juntando-se os documentos necessários, sobre a existência de infra-estrutura suficiente e em operação para o bombeamento do esgoto produzido pela comunidade; (ii) esclarecer sobre as providências adotadas para o controle e/ou minimização dos riscos das enchentes; (iii) – esclarecer quanto a viabilidade técnica para a drenagem da água/esgoto empossada na área urbanizada por meio do sistema coletor da SABESP, ainda que de forma excepcional.
iv. Favela do Oratório / Sapopemba – São Paulo
i. A imediata paralisação das obras de canalização do córrego Oratório até que o projeto de intervenção seja discutido com as 500 famílias que vivem ao longo do mesmo.
ii. A elaboração de um projeto de habitação de interesse social de forma a garantir o direito á moradia digna para a população atualmente residente no local.
iii. Garantir que as famílias atingidas por remoções participem das tomadas de decisões sobre a sua nova moradia;
iiii. No caso de uma família ser inserida em programa de aluguel social temporário, o poder público deverá garantir por escrito que essa família tenha um imóvel em determinado prazo e que fará parte da tomada de decisões sobre a sua nova moradia.
v. Parque Cocaia I – São Paulo
a) Suspensão imediata das ameaças e processos de remoção, promovidas pela administração municipal em razão das obras de intervenção do Programa Mananciais, envolvendo as 3.000 famílias da comunidade parque Cocaia I.
b) Discussão com a comunidade, plano de intervenção urbano e do plano de reassentamento com as soluções habitacionais que serão adotadas no caso das remoções necessárias.
c) Assinatura, por parte do Poder Público Municipal, de documento que garanta o retorno das famílias à comunidade após o término das obras e o pagamento de aluguel social, tal como o ocorrido com as últimas 40 famílias que deixarão o local provisoriamente.
d) Constituição de um grupo de trabalho, no âmbito do Ministério das Cidades, para o acompanhamento do projeto, realizado com recursos do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC, vinculando o repasse dos mesmos a garantia do direito à moradia e ao cumprimento de metas sociais por parte da Prefeitura Municipal.
vi. Complexo Águas Espraiadas – São Paulo
a) Suspensão imediata dos processos e das ameaças de despejos das 16 favelas situadas nas margens do Córrego Água Espraiada, promovidos em razão das obras da Prefeitura Municipal visando a construção de um túnel e de um parque linear.
b) Discussão com a comunidade, do plano de intervenção urbano e do plano de reassentamento com as soluções habitacionais que serão adotadas no caso das remoções necessárias e a garantia do direito à moradia para todos os afetados pela intervenção.
c) Imediato início das obras de construção das unidades habitacionais de interesse social.
d) No caso do Jardim Edite, já removida em 2009, a situação parece caminhar para uma solução negociada garantindo-se o direito à moradia para a população removida da favela. No entanto, é necessário dar início imediato à execução do projeto de urbanização do local e a construção das unidades habitacionais, conforme discutido com a comunidade.
vii. Ocupações Dersa-Ecovias – Diadema
a) A imediata suspensão das ameaças de remoção, por parte da Concessionária Ecovias, das diversas famílias que vivem as margens do córrego na Rodovia dos Imigrantes, onde ocorre a Operação Dersa-Ecovias, sem a garantia do seu direito à moradia assegurado.
b) A discussão, envolvendo a comunidade, o Governo Estadual e Poder Público Municipal, de um projeto de habitação de interesse social para as famílias atualmente residentes no local.
viii. Comunidade do Jardim Oratório
a) A imediata suspensão das obras de construção do viaduto do Rodoanel e das negociações individuais envolvendo a indenização das casas a serem removidas no bairro Jardim Oratório em razão desta obra.
ii. A discussão do projeto de construção do viaduto do Rodoanel com a comunidade de forma a adequar o cronograma das obras à mudança dos moradores que vivem no local onde serão realizadas as obras;
iii. A discussão coletiva das indenizações, envolvendo a associação de moradores, com critérios justos que garantam o acesso a um outro imóvel em boas condições de habitabilidade e que cubram custos relativos a reconstrução da vida desses moradores no novo local (mudança, compra de novos equipamentos, etc);
iv. A identificação e a reparação, por parte da empresa executora das obras, dos eventuais danos já causados a alguns dos moradores e comerciantes do bairro.
ix. População de Rua
a) Imediata paralisação das ações de violência promovidas pelos órgãos públicos de limpeza e segurança junto à população de rua.
b) Implantação de uma política de assistência social para a população de rua, nos moldes do preconizado pela lei municipal 12.316, de 1997, envolvendo (i) um sistema de acolhida, fundado nos albergues, o que requer a abertura de mais vagas e a capacitação do corpo técnico que trabalha junto a esses equipamentos; (ii) um sistema socioeducativo, envolvendo uma metodologia de trabalho com a população de rua, com cuidados espaciais voltados para o equilíbrio emocional e intelectual de todos que vivem nesta situação; (iii) um sistema de saída, com a incorporação de programa de trabalho – frente de trabalhos, capacitação, incubadora de cooperativas, etc.
c) O reconhecimento do movimento de população de rua, por parte do Poder Público Municipal, como interlocutor dessa política de assistência social, sem o qual as medidas adotadas terão pouca chance de alcançar efetividade e garantir o direito à cidade para esta população.
7.3. Recomendações Gerais
a) Criação de um Grupo de Trabalho que terá a função de monitoramento e acompanhamento dos casos visitados pela Relatoria. Este Grupo será formado pelos integrantes da organização dessa missão e também pelo Ministério Público Estadual e pelo Grupo de Mediação e Prevenção de Conflitos Fundiários do Poder Judiciário, como ouvinte.
b) Ações de denúncias perante o Conselho Regional do Serviço Social, indicando as ações das assistentes sociais que estão envolvidas nas ações de despejo e intimidação, para que estas sejam fiscalizadas. No caso de denúncias concretas envolvendo a identificação dos(as) assistentes sociais pode ser requerido a abertura de processo administrativo naquele órgão contra estas pessoas.
iii. Ações de denúncias junto ao Conselho Tutelar, tendo em vista os casos que envolvem o risco à vida de crianças e adolescentes envolvidos nas situações relacionadas às grandes obras de intervenção urbana e às ações de despejo.
iv. Envio de propostas de resoluções aos Conselhos de Habitação e aos Conselhos das Cidades (estadual e municipais, onde existirem), indicando a propositura de ações coletivas, a solicitação de informações complementares, a requisição de audiência com as autoridades e a indicação de soluções para os acasos apresentados.
Também foi proposta a criação de uma rede com famílias atingidas de todas as comunidades, a fim de reforçar o elo entre as comunidades e a resistência das famílias. Os moradores chegaram a sugerir, para o início de 2010, um dia de mobilização unificada, com ações simultâneas em todas as áreas, para denunciar o impacto dos projetos nas periferias.
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