A situação da moradia no Brasil e no Estado de São Paulo

No Brasil, moramos muito mal. É o que nos dizem os dados do IBGE. Também é o que nos os mostram as pessoas em cada canto deste país. Se a cada chuva ou cada despejo, a realidade escapa pela tela da TV para chegar aos lares daqueles que os têm, todos os dias milhões convivem com o barranco, o córrego, a palafita, a falta de dinheiro para pagar o aluguel, a água e a luz no final do mês, o quarto escuro e sem ventilação, o amontoado de gente no cômodo precário, as horas perdidas no transporte coletivo.

De acordo com a Fundação João Pinheiro, com base nos dados do Censo 2001, a necessidade quantitativa de moradias corresponde a 7,2 milhões de novas unidades, das quais 5,4 milhões nas áreas urbanas e 1,7 milhões nas áreas rurais. 92% do déficit habitacional urbano está concentrado nas famílias com renda de até cinco salários mínimos. Em todas as regiões, inclusive nas áreas metropolitanas, o problema recai sobres às faixas de menor renda. A maior parcela da necessidade habitacional concentra-se nos Estados do Nordeste (38%) e do Sudeste (32%). Do total do déficit 31% dessas famílias encontram-se em Regiões Metropolitanas.

O déficit habitacional no Estado de São Paulo, divulgado oficialmente, é da ordem de 740 mil novas moradias, o que significa aproximadamente 3,7 milhões de pessoas e mais de 10% do total brasileiro. Déficit habitacional qualitativo no estado de São Paulo.

Adensamento excessivo Inadequação funiária urbana Carência e infra-estructura básica Inexistência de  unidade sanitária Inadequação por depreciação
701.847 442.539 580.143 121.815 196.290

O outro problema refere-se ao crescimento dos assentamentos irregulares que, conforme dados do Censo 2000, fazem com que, em muitas cidades brasileiras, a cidade irregular cresça quatro vezes mais depressa do que a cidade regular, tanto em número de domicílios como de população. Paradoxalmente, há em todo o País, 4,6 milhões de imóveis vagos, dos quais 1,7 milhão estão situados centros das cidades e nos aglomerados metropolitanos.

Na cidade de São Paulo há mais de 400 mil domicílios vazios e enquanto, os bairros com infra-estrutura vem perdendo a população nas últimas décadas os bairros de até -2% ao ano e os bairros da periferias e as cidades pobres e sem infra-estrutura vem ganham população com índices até superiores a 3%/ano. Esse crescimento é também visível se compararmos o crescimento do população favelada e o crescimento populacional da cidade de São Paulo, que em 1980 representava 3,45% do total da população em 2000 representava 8,73%.

A ação do poder público

A ação governamental junto à moradia popular historicamente foi marcada por dois traços principais: primeiro, a insuficiência de capacidade e de recursos para uma política de universalização do direto á moradia; segundo, pela incapacidade de atender prioritariamente quem mais precisa e que representa, como vimos, a maior parte do déficit.

As linhas de financiamento que concentram maiores recursos – do FGTS ou da caderneta de poupança – esbarram na burocracia e são feitas para aqueles que, de alguma maneira, já estão incluídos. Um bom exemplo é a análise de risco de crédito a que os “candidatos” são submetidos para a obtenção de financiamento para a habitação. Retrógrados, utilizam-se de cadastros do mercado, como SPC e SERASA, para a consecução de um direito do cidadão. O mesmo se aplica com a exigência de escritura individual dos terrenos a serem utilizados para a produção habitacional, aquisição de imóvel ou acesso a qualquer programa público. A ocupação, a irregularidade fundiária de longe não é a exceção, mas a regra. Assim, ao fazer tal exigência, a política oficial declara que todo o território popular de luta e de conquista não serve para ela por não oferecer garantias ao financiamento tomado, contaminando com uma lógica bancária o que é um direito.

Outro limite diz respeito à falta de coordenação e articulação entre os três níveis de governo na ação na área. Cada prefeitura ou governo estadual tem (ou não) estrutura, recursos, programas que pouco dialogam entre si. Recursos orçamentários, nos três níveis, que possam subsidiar a população de mais baixa renda são escassos.

Reivindicação histórica dos movimentos sociais que atuam na área, a criação do Ministério das Cidades veio em direção da superação dessa lacuna de articulação governamental e para superar a fragmentação das políticas de desenvolvimento urbano. Apesar de ainda atuar de maneira bastante setorial, há iniciativas de construção de políticas de maneira mais integrada. As Conferências das Cidades, em 2003 e 2005, indicaram este caminho.

Os processos de construção da 1ª e da 2ª Conferência das Cidades são marcos de uma nova forma de elaboração da política. Com uma mobilização bastante expressiva para um setor que ela primeira vez realizou Conferências, suas duas edições atingiram a maioria dos municípios brasileiros e contaram com a participação dos diversos setores e segmentos sociais da área. Em 2003, a pauta setorial ainda foi preponderante e suas resoluções deram base para a elaboração das políticas nacionais de habitação, saneamento e mobilidade e ainda da Campanha Nacional do Plano Diretor Participativo. Na sua segunda edição, a Conferência centrou-se em aspetos da política de desenvolvimento urbano, como financiamento, questão federativa, desenvolvimento regional e controle social.

O Conselho das Cidades, que termina em abril seu primeiro mandato, é a primeira grande experiência de participação institucional em nível nacional na área do desenvolvimento urbano. Um conselho com uma composição inovadora com maioria dos participantes da sociedade civil, onde cerca de 42% de seus membros são do poder público – federal, estadual e municipal – e os outros 57% de diversos segmentos da sociedade civil. Destes, o segmento com maior representação é o movimento popular. Participam ainda, empresários e trabalhadores da área, Ongs e entidades acadêmicas e profissionais.

O Ministério das Cidades, na área de habitação, atuou em dois eixos principais, um em curto prazo, revendo os programas existentes e ampliando os recursos investidos. A mais longo prazo está modificando a regulamentação do setor.

Na revisão dos programas priorizou a focalização dos subsídios na faixa entre de 0 a 5 salários mínimos, privilegiou as operações estruturadas por entidades públicas, objetivando a soma dos subsídios estaduais e municipais, direcionou o subsídio do FGTS, antes dispersos, para as famílias que ganham até 5 salários mínimos e possibilitou ampliar a lógica do atendimento exclusivamente individual por meio da atuação de estados e municípios como organizadores da demanda e complementação dos subsídios.

Com essas ações de ampliação dos recursos do FAT, FGTS, FAR, Orçamento da União e FDS, conseguiu-se sair de um investimento na ordem de 5,2 bilhões em 2002 para 9,2 bilhões em 2005, com uma perspectiva de ultrapassar a casa de 12 bilhões em 2006. Uma conquista ainda mais importante é que os recursos estão atingindo uma maior parte do déficit concentrado na população de menor renda. Enquanto em 2002, só 32% dos recursos foram destinados a famílias com renda até 3 salários mínimos; em 2005, essa faixa aumentou para 46%. Ainda está distante dos índices do déficit, mas representa um avanço na atuação do poder público.

Resultado das pressões dos movimentos sociais, o Ministério criou um novo programa, chamado Crédito Solidário, com recursos do Fundo de Desenvolvimento Social. O programa é voltado para cooperativas ou por associações com fins habitacionais para o atendimento da população de baixa renda, visando à produção de novas habitações, a conclusão e reforma de moradias existentes, mediante concessão de financiamento diretamente ao beneficiário, a juros zero. Apesar de estar em operação há quase dois anos, só agora as primeiras obras se iniciam, com diversas dificuldades, em especial nas exigências burocráticas e na falta de cultura do governo federal para tratar com organizações sociais e com a autogestão.

O objetivo em longo prazo foca-se na reestruturação institucional e legal do setor habitacional. O principal eixo é a criação do Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social – SNHIS, que detalharemos mais adiante.

Rumo ao Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social

As mudanças mais significativas, no entanto, ainda estão por vir. Em junho de 2005, o presidente Lula sancionou a Lei 11.124 que cria o Sistema, o Fundo e o Conselho Gestor do Fundo de Habitação de Interesse Social. Fruto do primeiro projeto de lei de iniciativa popular que foi entregue ao Congresso Nacional em novembro de 1991, com 1 milhão de assinaturas por uma grande articulação de movimentos populares urbanos, Ongs, trabalhadores. Este projeto é um marco na construção da política habitacional brasileira.

O projeto tem sido a principal agenda de luta desde então, que pauta as mobilizações e enfrentamentos dos movimentos. O PL propunha que a política se baseasse em alguns princípios:
-prioridade para a população de mais baixa renda;
-articulação de todos os recursos onerosos e orçamentários destinados à habitação em um único fundo;
-articulação da política e os recursos dos três níveis de governo;
-gestão e democrática da política em todos os níveis.

Desde o início desta gestão, esta foi a principal pauta de negociação com o governo, que finalmente apresentou um substitutivo em 2004, porém com diversas modificações da proposta que tramitava no Congresso. A principal delas diz respeito à não inclusão dos recursos onerosos, especialmente do FGTS, no Fundo. Essa posição restringiu as possibilidades de atuação do Sistema, que continuará sendo parcial e continuará concorrendo com outras linhas de financiamento do próprio governo federal. Os movimentos sociais continuarão pressionando pela sua inclusão.

Em fevereiro de 2006, o presidente Lula, anunciou a destinação de um bilhão de reais do orçamento para o Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social, prioritariamente para o atendimento de famílias moradoras em palafitas e favelas. Esse recurso foi fruto da pressão feita em agosto de 2006, em Brasília pelas entidades nacionais dos movimentos populares urbanos – União Nacional por Moradia Popular, Confederação Nacional de Associações de Moradores, Movimento Nacional de Luta por Moradia e Central de Movimentos Populares – junto ao Fórum Nacional da Reforma Urbana.

Ainda falta a regulamentação da Lei 11.124, ponto polêmico entre o governo federal e as entidades do ConCidades, em especial no que diz respeito à composição do Conselho Gestor do Fundo. A visão do governo federal é de que a metade dos membros do Conselho, que representa o poder público deverá contemplar apenas o governo federal, excluindo Estados e municípios. O ConCidades aprovou resolução contrária a este princípio e espera que o governo a considere na edição do decreto de regulamentação. Além disso, as entidades reivindicam a discussão da minuta do decreto no ConCidades, especialmente no que diz respeito às competências do Conselho Gestor e do Ministério. Ainda em fevereiro de 2006, o Ministério apresentou as regras, critérios e formatos dos programas com os recursos que compõe o Fundo para 2006. Como a regulamentação não foi feita e, portanto, o Conselho Gestor ainda não foi implementado, esse processo foi feito de forma unilateral, iniciando a atuação do Fundo de maneira totalmente incoerente com a sua construção e concepção democrática.

Outro desafio é a implantação do Sistema em todo país. Pela lei, municípios e estados só poderão ter acesso aos recursos do FNHIS se constituírem fundos e conselhos municipais ou estaduais e elaborarem o seu plano de habitação. Mas do que uma exigência formal, esta é uma grande oportunidade de levar este debate para todo o país e colocar a habitação na agenda política. É preciso capacitar e mobilizar os diversos atores, para que esse processo garanta a participação em todas as suas etapas e o protagonismo dos movimentos sociais.

Política Estadual de Habitação

A destinação da alíquota de 1% do ICMS para a habitação gerou uma quantidade de recursos considerável para se enfrentar o problema da habitação no Estado de São Paulo. No entanto, a centralização institucional, a péssima distribuição regional dos recursos, a inexistência de um amplo leque de programas compatíveis com a diversidade do problema e a concentração na produção de unidades novas por empreiteira, entre outros, não permitiram que se resolvesse o problema habitacional do Estado, que cresceu no período do Governo Covas/Alckmin (1995-2006).

Apesar de contar com uma grande fonte de recursos orçamentários (cerca de R$ 4,3 bilhões no período de 1995/2002), a ação do CDHU não atendeu à população com faixa de renda onde se concentra o déficit habitacional, ou seja, a faixa de renda de zero a três salários mínimos – sua ação tem se concentrado nas faixas de renda de 4 a 10 salários mínimos.

Ano U.H. prevista U.H. entregues U.H. entregues % Orçamento previsto R$ Orçamento executado R$ Orçamento executado %
2000 36.475 5.629 15,43 528.673.664 487.689.314 92,24
2001 67.964 10.476 15,41 601.495.758 520.262.737 86,49
2002 70.000 21.221 30,00 549.427.691 397.127.151 72,28
2003 53.154 22.454 42,24 575.921.675 327.692.803 56,89
Total 228.193 59.780 26,19 2.255.518.788 1.732.772.005 76,82

É visível a distância entre a necessidade habitacional no estado de São Paulo e a produção do governo estadual, que faz com que cada ano o déficit habitacional cresça.

A política estadual de habitação não busca atender a população de baixa renda de até 03 salários mínimos, priorizando programas com a produção habitacional por empreiteiras, não possuindo compromisso com a participação popular, transparência nas ações e com o Fundo Estadual de Habitação.

Moradia e Cidade

O produto das diversas políticas públicas de habitação de interes social ainda parece ignorar o conceito de direito à cidade. Ainda insistimos em conjuntos habitacionais distantes de tudo, de baixa qualidade, que desrespeitam o jeito do povo viver e se relacionar. É a “casinha” de menos de 40 metros quadrados, 20 anos para pagar, se você conseguir passar nas diversas peneiras para o acesso o crédito.

É preciso incorporar a política habitacional ao planejamento urbano, rompendo o apartheid territorial das nossas cidades. Através das ferramentas como o plano diretor, as zonas especiais de interesse social, entre outras presente no Estatuto da Cidade, é preciso garantir o acesso a terra urbanizada e bem localizada para todas as faixas de renda e deixar de lado a tradicional dualidade de que política habitacional é para os pobres e o planejamento urbano para os ricos. Até outubro deste ano, mais de 1700 municípios deverão fazer os seus planos diretores. O desafio é planejar com inclusão e participação.

As lutas urbanas já incorporaram estes princípios. Já não é novidade a ocupação de vazios urbanos e edifícios ociosos em áreas centrais que reivindicam, além do direito à moradia, o direito aos benefícios produzidos socialmente na cidade. A proximidade do trabalho, dos equipamentos públicos, enfim das oportunidades devem ser consideradas para a produção habitacional. As políticas habitacionais precisam incorporar essa visão e mudarem radicalmente a forma de produzir e financiar a moradia popular.

A urbanização e a garantia de posse nas favelas e áreas ocupadas é outra linha de ação importante nessa área, pois é inadmissível a expulsão de famílias que construíram suas moradias nesses lugares exatamente devido à falta de políticas públicas e investiram mais do que qualquer programa habitacional. Remoção de favela para áreas distantes e sem infra-estrutura não pode pautar a política habitacional e os casos que envolvem risco devem ser tratados com a participação das comunidades e em áreas próximas do local original.

A falta de uma política fundiária para o Estado, articulada com a política habitacional e urbana, bem como a inoperância do sistema de aquisição de terra, definido entre os Municípios e o Estado, prejudicam não apenas a política habitacional como todas as políticas sociais.

Os municípios também têm responsabilidade quanto à habitação e também devem ter política habitacional e alocação de recursos municipais para isso. Mas, sobretudo, deve ser o grande articulador da ação pública na área, tanto na captação de recursos quanto na definição das políticas na cidade. Alguns bons exemplos de programas habitacionais se encontram em alguns municípios, apesar da grande maioria se omitir nesse campo. Com a aprovação, em 2001, da lei Federal que criou o Estatuto da Cidade, o município passou a ter um papel fundamental na questão da reforma urbana e da política fundiária, pois tem instrumentos fortes e eficientes para garantir o cumprimento da função social da propriedade urbana, a regularização das áreas ocupadas e o planejamento urbano.

A ação dos movimentos populares

As entidades nacionais da luta por moradia -União Nacional por Moradia Popular, Confederação Nacional de Associações de Moradores, Movimento Nacional de Luta por Moradia e Central de Movimentos Populares – junto ao Fórum Nacional da Reforma Urbana têm sido os principais interlocutores destas formulações. Atuando em todos os estados brasileiros, estão construindo a reforma urbana na prática cotidiana. A construção de alternativas e a luta por participação nos diversos níveis é a marca dessa atuação.

A autogestão também tem sido uma bandeira de luta histórica onde os movimentos reivindicam a condução e a gestão dos processos habitacionais pelas próprias comunidades. Entende-se esta prática, já desenvolvida em diversos estados brasileiros, como uma maneira de construir moradias com melhor qualidade e adequada às necessidades daquela comunidade e com custos menores que o mercado. Ao mesmo tempo, é uma maneira de fortalecimento e capacitação para que essas famílias compreendam todo processo que envolvem a conquista de seu direito, desde o terreno a ser utilizado, a origem dos recursos, a negociação com os agentes públicos e privados, a forma de produção da moradia. É um processo politizador que além de construir a casa, constrói o cidadão que nela vai morar e que fortalece os laços comunitários para novas lutas.

O fortalecimento de atores políticos é o grande objetivo. Só assim, é possível pensar em novas formas de construção de poder, descentralizado, garantindo maior autonomia e incidência das entidades da sociedade civil no cenário político. Assim é possível colocar o direito à cidade e à moradia em pauta para que a sociedade exija as mudanças necessárias.

2.1. PARA CADA TIPO DE PROBLEMA, UMA PROPOSTA DIFERENTE

A população pobre que necessita de moradia acaba ocupando áreas onde não se implantou efetivamente toda a rede de infra-estrutura necessária para uma habitação digna. Surgem em diferentes pontos das periferias das grandes cidades outras “cidades paralelas” ou “cidades ocultas” – que são precárias, clandestinas, ilegais e subequipadas.

A UMM tem proposto e reivindicado ao poder público uma nova concepção de política habitacional, baseada na prioridade às famílias de mais baixa renda, na diversidade de programas para os diferentes problemas habitacionais das cidades e na integração entre política urbana e política habitacional. Nesse sentido, mais que lutar por “casas” a UMM luta por melhores cidades, com espaço para a moradia dos mais pobres com dignidade e qualidade de vida.

A partir da aprovação da Lei 11.124/2005, todos os Estados e municípios brasileiros, para participar do Sistema Nacional de habitação de Interesse Social e ter acesso aos recursos federais para habitação, devem constituir um Fundo e um Conselho de Habitação de Interesse Social. O grande desafio agora é a sua implementação, para que em todas as suas instâncias sejam garantidas a participação popular e o protagonismo dos movimentos populares, combatendo o fisiologismo, o clientelismo e a corrupção tão comum no Estado brasileiro. Em cada localidade, é preciso mobilizar os diversos atores sociais, pressionar o Executivo e Legislativo e construir o melhor modelo para atender ás especificidades locais.

FAVELAS

Realidade – As favelas são aglomerados de moradias estruturalmente inadequadas, localizadas em morros, em faixas de córregos, fundos de vales, regiões alagadiças, mangues ou em condições topográficas de difícil aproveitamento. São construídas com madeira velha, zinco, plástico e papelão ou em alvenaria, como vemos mais recentemente, em áreas públicas ou particulares, sem regulamentação e não apresentam infra-estrutura adequada. Em 1970, apenas 1% da população da Grande São Paulo vivia em favelas. Em 2001, ela havia dado um salto, para nada menos de 20%.

Políticas existentes – Historicamente, a atuação dos programas públicos tem removido as famílias faveladas para áreas distantes, “limpando” as áreas por elas ocupadas. Mais recentemente, existe projetos de verticalização, que derrubam as casas das famílias para a construção de conjuntos, com alto custo e baixíssima qualidade. Também, nos últimos anos, algumas administrações municipais, após pressões dos movimentos de favelas, criaram programas de urbanização de favelas e regularização fundiária, mas, ainda bastante restrito.

Nossa proposta – A UMM luta pela regularização fundiária das favelas, conquistando a posse coletiva do terreno e pela urbanização, implantando infra-estrutura, desadensando onde for necessário e transformando favelas em bairros. Graças à luta dos movimentos, todas as favelas da capital estão demarcadas como ZEIS (Zona Especial de Interesse Social) no novo Plano Diretor. A UMM atua, também, nas áreas de risco, apoiando as famílias a se organizarem previamente e nos momentos de enchentes e deslizamentos, para assegurar o atendimento habitacional de forma mais adequada às necessidades das famílias.

CORTIÇO

Realidade – Os cortiços são moradias coletivas de aluguel e encontram-se nas grandes cidades, em geral, em áreas já consolidadas e/ou deterioradas da cidade e apresentam diversas características:
-conjunto de uma ou mais edificações no mesmo lote, subdividido em cômodos, com elevada taxa de densidade demográfica;
-cômodos alugados, subalugados ou cedidos a qualquer título, muitas vezes sem contrato legal de locação;
-superlotação e alta rotatividade dos moradores;
-local sem privacidade, ventilação e iluminação;
-um único cômodo para: dormir, cozinhar, assistir TV e estudar;
-usos comuns dos banheiros, pias e tanques, que em geral apresentam condições precárias condições sanitárias;
-exploração nos valores da locação.

Ao lado dessa realidade, muitos edifícios e casas particulares e públicos permanecem fechados na região central da capital e de algumas grandes cidades. Conforme IBGE 2000, no centro da cidade de São Paulo há 40.000 domicílios fechados.

Políticas existentes – As políticas habitacionais de habitação de popular sempre tiveram como estratégia a construção de conjuntos em áreas distantes, expulsando as famílias moradoras das regiões centrais. Mais recentemente, devido às pressões dos movimentos, foram criados programas para as áreas centrais, com produções pontuais e sem continuidade. A atual administração de São Paulo, de 2005 a 2008, vem implantando políticas para a área central embasada em visões “higienista” e paralisando projetos de habitação popular no centro.

Nossas propostas – A UMM tem uma forte atuação na área, propondo a conversão de prédios vazios – comerciais ou residenciais em moradia popular. Para isso tem apresentado suas propostas, participado dos espaços de negociação e discussão dos programas de requalificação da área central. Tem, também, utilizado a estratégia de ocupação de prédios vazios como ferramenta de pressão, o que chamou atenção da sociedade para o problema e tem garantido algumas vitórias.

LOTEAMENTO CLANDESTINO E IRREGULAR

Realidade – Os loteamentos irregulares ou clandestinos nascem, muitas vezes, da ausência de alternativas legais para a moradia. Em geral, ocupam áreas de proteção ambiental, de mananciais ou rurais que não se destinam a este fim.

O Mercado Imobiliário é um dos maiores especuladores, ocupando as áreas com a conivência do poder público e deixando os moradores sem condições de obter a sua regularização e urbanização. Em outras áreas, são frutos de ocupações desordenadas onde se busca a regularização.

Na capital, envolve uma população estimada de 3 milhões de pessoas que compraram irregularmente, nada mesmo que 17% do território paulistano, o equivalente de a 250 km.

Políticas existentes – A total omissão e conivência do poder público para fazer cumprir a lei, que obriga os loteadores a implantar a infra-estrutura nas áreas, antes da venda dos lotes, faz com que esses serviços sejam tardiamente implantados e negociados caso-a-caso como moeda eleitoral. Além disso, os moradores vivem com a constante ameaça de despejo. Atualmente, algumas prefeituras têm programas para a regularização, conveniados com entidades multilaterais, mas ainda de pouca escala para o tamanho do problema.

Nossas propostas – Os Loteamentos lutam pela regularização de suas áreas, através de convênio com entidades de assistência jurídica e por programas de urbanização desses bairros.

SEM-TETO

Realidade – A falta de linhas de financiamento habitacional e de uma produção habitacional para a população de baixa renda faz com que um número cada vez maior de famílias engrossem o déficit quantitativo de moradias no Estado, como já expusemos anteriormente.

Programas existentes – As unidades e conjuntos habitacionais construídos pelos últimos Governos geraram péssima qualidade de vida para os seus moradores (falta de privacidade, umidade, problemas acústicos, falta de qualidade da construção, distância da malha urbana e dos serviços públicos). Verifica-se uma monotonia de projetos, de conjuntos e de loteamentos descolados da malha urbana (utilização de tipologia habitacional padrão – planta e construção), desprovidos de infra-estrutura e desarticulados de uma política urbana. O custo final destas unidades é sempre elevado, com altos custos fundiários e de produção. A situação é ainda mais grave em pequenos e médios municípios, onde soluções de custo muito mais baixo, com participação da população, poderiam ter sido implementadas.

Nossas propostas – A UMM defende o controle social e a autogestão na produção de novos conjuntos habitacionais. Buscamos evitar grandes projetos, e sim a construção pequenos conjuntos inseridos na malha urbana existente. Essa experiência de controle de recursos públicos – tanto no Estado, CEF e alguns municípios – se demonstrou vitoriosa, com mais de 30 mil moradias construídas, em 18 anos. Nesse modelo, a associação, em parceria com o poder público e uma assessoria técnica, tem como responsabilidade a gestão de todas as fases da construção do conjunto – definição de projeto, seleção das famílias, compra dos materiais, contratação de mão-de-obra, prestação de contas, etc. parte da execução da obra é feita com a mão-de-obra das próprias famílias – mutirão – e parte é contratada para esse fim.

Essa tem sido a maior luta da UMM, que pressiona o poder público para a concessão de financiamentos e a destinação de áreas para os programas. Atualmente, passamos por um momento de reformulação da proposta, cujo objetivo é o aprofundamento da autogestão, estendendo-a até outros campos, como a negociação e compra dos terrenos.

Estamos atuando também nos municípios para a demarcação de Zonas de Interesse Social em vazios urbanos e pela aplicação dos instrumentos de reforma urbana nessas áreas, através do plano diretor de cada município onde existe organização da UMM.

2.2. FERRAMENTAS DE LUTA

A União dos Movimentos de Moradia entende que o papel do movimento popular é tanto de denúncia da problemática e reivindicação, quanto de anúncio de uma nova realidade.

Nesse sentido, a primeira estratégia é dar publicidade ao problema da moradia no Estado, problemas este muitas vezes distante dos olhos das elites e ocultados pelos meios da mídia. Denúncia também do descaso do poder público, da falta de políticas efetivas e da corrupção que, muitas vezes, consome os poucos recursos existentes. E, por fim, a luta pelo reconhecimento político da organização dos trabalhadores, como sujeitos sociais de uma nova ordem, não como mero “público-alvo” dos programas existentes.

Mas o movimento não pode somente denunciar. Ele deve também apresentar propostas elaboradas sob o ponto de vista da população para solucionar a questão e participar em todos os níveis – elaboração, priorização, execução e avaliação – das políticas públicas e dos programas setoriais. A UMM tem atuado junto ao Executivo, apresentando propostas desde o nível macro – como no Projeto Moradia – até para os projetos de cada uma das áreas. Também atua junto ao Legislativo, acompanhando e propondo projetos de lei.

Para esse fim, utiliza diversas “ferramentas de luta” como a mobilização de base – premissa de toda a organização – , a negociação direta com os órgãos públicos, as manifestações em órgãos públicos, o trabalho de relacionamento com a mídia, e, quando não existem caminhos de negociação, as ocupações de terrenos e prédios públicos ou privados

A UMM participa ainda de diversas instâncias institucionais de gestão e participação como as Conferências de habitação e das Cidades, no estado e nos municípios que elas existem, dos Conselhos de habitação e de saneamento, do Orçamento participativo, entre outros. Isso tudo, porem, sem perder o caráter da luta e mobilização fundamental para o movimento. No Estado de São Paulo, ainda não existem vários desses instrumentos institucionais, algo que é uma pauta constante de luta.

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